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Enxaqueca não tem cura, mas pode ser controlada;

23 de setembro de 2013
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A OMS (Organização Mundial de Saúde) apontou a enxaqueca como a quarta doença crônica mais incapacitante no mundo, atrás apenas da tetraplegia, psicose e demência. A dor intensa de cabeça, que pode vir associada a outros sintomas, é tão perturbadora que, nos Estados Unidos, o governo calcula perder US$ 12 milhões por ano com funcionários que faltam ao trabalho por causa do problema.

Por definição, enxaqueca é uma cefaleia benigna, isto é, não está relacionada a tumores ou outras moléstias graves. Na crise, o paciente pode sentir intolerância à luz e a cheiros, náuseas, vômito e vertigem. A dor é pulsátil ou latejante, ocorrendo de um lado da cabeça, ou alternando de um lado para outro durante os episódios. A duração vai de quatro a 72 horas e costuma piorar com esforço físico e melhorar com repouso e sono.

Sintomas acompanham crise

Algumas pessoas, antes de a dor chegar, podem sofrer com perturbações visuais (enxergar pontos luminosos, por exemplo) ou formigamentos em alguma parte do corpo. E é importante não confundir dor de cabeça forte com enxaqueca. A Sociedade Internacional de Cefaleia reconhece mais de 150 modalidades de dor de cabeça, e a enxaqueca é uma delas.

“A cefaleia é o termo usado para qualquer dor localizada no crânio ou na face. Já a enxaqueca é uma forma específica de dor de cabeça, uma síndrome caracterizada por crânio latejante, geralmente unilateral, acompanhado por náuseas, vômitos, dificuldades com luz ou barulho e tontura, sendo em sua maioria de média a alta intensidade”, explica Flávio Sallem, neurologista do Hospital das Clínicas e do Hospital do Coração (HCor), em São Paulo, criador do blog Neuroinformação.

Culpa dos neurotransmissores

Em relação à origem do problema, Abouch Krymchantowski, neurologista especializado em dor de cabeça e enxaqueca, membro da American Headache Society e da International Headache Society, esclarece que se trata de uma doença de neurotransmissores como serotonina, noradrenalina, dopamina e glutamato, transmitida por meio de genes, que pode ou não causar crises de dor de cabeça. Quer dizer, é possível o sujeito sofrer com enxaqueca sem apresentar dor.

“Há pacientes sem queixa alguma, outros com incômodos bem pouco frequentes e terceiros com crises constantes e incapacitantes. E são estes últimos que, em geral, procuram ajuda médica”, diz o neurologista.

A disfunção, portanto, é genética, um distúrbio neurovascular crônico. Isso quer dizer que, caso você tenha os sintomas, é muito provável que seus pais também os manifestem. Em cerca de 15% dos casos, o quadro de dor é precedido por uma aura premonitória que envolve sinais neurológicos – como as alterações visuais. Sem tratamento, a crise típica pode durar até três dias.

Para caracterizá-la e ter certeza do diagnóstico, é necessário apresentar mais de dois dos sintomas: dor unilateral, dor de intensidade média ou forte, latejamento e piora com a movimentação; e um dentre os sinais náusea ou vômito, fotofobia (sensibilidade à luz) ou fonofobia (desconforto provocado por sons).

Consultório

Conforme garante Sallem, o diagnóstico é feito em consultório, com levantamento de dados do histórico e da análise neurológica normal. “O estudo do paciente serve para descartar outras doenças que poderiam, supostamente, estar causando os sintomas.”

Como a enxaqueca é uma disfunção química e genética do cérebro, não aparece em nenhum exame complementar. “Se fizermos um pet scan durante uma crise, veremos alterações já conhecidas e não suficientes para comprovar o problema, cuja diagnose é essencialmente clínica e baseada em consultas demoradas, criteriosas e completas. Em testes de ressonância magnética funcional do cérebro nos últimos dez anos, também tem se evidenciado que o cérebro de pacientes com o distúrbio apresenta alterações em áreas de processamento da dor, mas isso não serve para diagnóstico. Cuidado com médicos que fazem consultas de dez minutos e pedem uma série de exames. Isso é incorreto e injustificado”, completa Krymchantowski.

Mulheres: vítimas preferenciais

Quanto à prevalência da enxaqueca, ela ataca mais as mulheres do que os homens: estudos mostram que de 15% a 18% das mulheres e 6% dos homens apresentam sintomas característicos da doença. Na população em geral, a incidência atinge 11%. E, embora o primeiro ataque possa acontecer até na velhice, o mais comum é surgir já na adolescência.

A frequência das crises é de 1,5 ao mês, mas pelo menos 10% sofrem com ataques semanais. A duração média é de 24 horas, sendo que 20% se estende a dois ou três dias. No Brasil, cerca de 1% da população tem pelo menos um episódio por semana.

Tratamento

O tratamento mais eficaz é multidisciplinar e calcado em três pilares, ressalta Krymchantowski. O primeiro deles é a educação do paciente, com orientações sobre o que é a doença e como reduzir seu impacto. Em segundo, há métodos preventivos com emprego de drogas de uso diário que vão modular os mecanismos do distúrbio no cérebro.

“Nesse sentido, podemos usar remédios como neuromoduladores, betabloqueadores e antidepressivos tricíclicos. Todos, em maior ou menor grau, regulam os sistemas dos diferentes neurotransmissores”, afirma Krymchantowski. Por fim, na hora de cuidar da crise propriamente dita, o médico pode combinar triptanos com anti-inflamatórios.

Sallem complementa dizendo que há caminhos não farmacológicos, como o biofeedback, método que usa um aparelho com eletrodos que são ligados a diferentes partes do corpo. “Há, ainda, outras opções, como estimulação magnética transcraniana ou o uso de toxina botulínica, que está sendo testada em indivíduos que não reagem a outras técnicas.”

Importante: a maioria dos médicos defende que medidas preventivas devem ser instituídas quando acontecem pelo menos dois ataques por mês, ou quando há aumento na incidência das crises. Como as medicações costumam apresentar efeitos indesejáveis, devem ser prescritas por médicos experientes. Acredita-se que, em média, 2/3 dos portadores que recebem tratamento preventivo se beneficiam com redução de 50% no número de ataques.

Como doença neurológica genética, ela realmente não tem cura. No entanto, os sintomas, sejam dor de cabeça ou não, podem desaparecer espontaneamente um dia ou como consequência de um tratamento bem feito.

“Tenho muitos pacientes que ficaram sem crises de dor ou com sua constância pelo menos 90% menor após tratamentos bem empregados. Alguns permaneceram assim mesmo com a suspensão dos remédios, pois adotaram hábitos saudáveis como a prática de exercícios, regularidade de alimentação e sono, vida sexual ativa e gerenciamento do estresse”, atesta Krymchantowski.

Em muitos pacientes, em especial nas mulheres, a dor pode desaparecer com a menopausa, por conta de fatores hormonais.

Rosana Faria de Freitas
Do UOL, em São Paulo

23/09/2013

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